50 Anos de Transformação na Indústria Portuguesa: Um olhar sobre o Passado, Presente e Futuro

Desde os anos 70 até aos dias de hoje, a indústria portuguesa tem sido palco de uma evolução notável, marcada por diferentes épocas e desafios específicos. Neste artigo da INTROSYS exploramos esta jornada, destacando as principais transformações que moldaram o setor industrial português ao longo dos últimos 50 anos.

Década de 1960: Dinamismo e Modernização Industrial

A década de 1960 foi marcada por um dinamismo sem precedentes na indústria portuguesa, impulsionado pelo período pós-segunda guerra mundial. O crescimento económico atingiu níveis impressionantes, com taxas de cerca de 8% ao ano. No entanto, este crescimento não foi uniforme, com o setor agrícola enfrentando estagnação e falta de reforma, enquanto o êxodo rural e a emigração clandestina aumentaram consideravelmente. O modelo económico da época baseava-se em baixos custos de produção e numa indústria orientada principalmente para o mercado interno.

A adesão à European Free Trade Association (EFTA) em 1960 e as remessas do exterior, incluindo aquelas provenientes da emigração, desempenharam um papel fundamental no estímulo ao crescimento inicial.

Vários setores industriais experimentaram taxas de crescimento elevadas, destacando-se a indústria do papel, química, transformação de produtos diversos e produtos metálicos. A chegada de empresas estrangeiras ou a participação destas em empresas portuguesas também foi uma característica marcante deste período. O desenvolvimento da eletrónica trouxe consigo novos produtos e uma diversificação significativa, influenciando positivamente o mercado de trabalho e introduzindo novas formas de organização e trabalho.

Observou-se um movimento significativo nas indústrias extrativas e, especialmente, nas indústrias transformadoras, com destaque para as metalúrgicas, produtos metálicos, material elétrico e máquinas elétricas. Este período foi crucial na construção das bases para a modernização e expansão da indústria portuguesa.

Década de 1970: Os Desafios da Crise

A transição para a década de 1970 marcou um período de mudança significativa para a indústria portuguesa. A partir de 1968, surgiram os primeiros sinais de crise, agravada pela conjuntura internacional e a crise do petróleo, que culminou em 25 de abril de 1974, com o golpe de estado que pôs fim à ditadura do Estado Novo.

Além das transformações políticas e sociais, a revolução trouxe consigo o fenómeno das nacionalizações, seguido pela integração europeia e privatizações. Esta sequência de eventos marcou o início de um período de desindustrialização acentuada. As lutas sindicais e operárias, juntamente com as suas atribulações nas empresas, contribuíram para esse declínio, bem como o fim dos mercados coloniais e as políticas europeias, levando ao encerramento de múltiplas empresas em diversas áreas de atividade.

A década de 1970 representou uma época de desafios sem precedentes que moldaram profundamente o cenário industrial do país para as décadas seguintes.

Década de 1980: Integração Europeia e Diversificação

O ciclo negativo persistiu até meados da década de 80, período durante o qual as indústrias de bens de consumo mantiveram um crescimento mínimo da produtividade, contrastando com fortes quedas nas indústrias de bens intermédios e de equipamento.

A entrada de Portugal na Comunidade Económica Europeia, em 1986, representou um ponto de viragem crucial, abrindo as portas para uma nova era de oportunidades e crescimento. Com a adesão à União Europeia, Portugal integrou-se num mercado único e competitivo, o que impulsionou a modernização e diversificação da sua indústria. Setores tradicionais, como o têxtil e o calçado, continuaram a ter um papel importante, mas novas indústrias, como a tecnologia e o automóvel, começaram a ganhar destaque.

O investimento direto estrangeiro, nomeadamente na Renault e Autoeuropa, desempenharam um papel vital no desenvolvimento de setores como o automóvel, produtos e instrumentos metálicos ou moldes e plásticos, através da constituição de redes de fornecedores de base nacional.

Década de 1990: Globalização e Desafios Competitivos

Nos anos 90, a globalização trouxe consigo novos desafios e oportunidades para a indústria portuguesa. Com a intensificação da concorrência internacional, as empresas viram-se obrigadas a encontrar formas de aumentar sua competitividade. Neste contexto, a modernização tecnológica emergiu como uma prioridade incontornável, resultando em investimentos significativos em automação e digitalização dos processos industriais.

Os últimos quinze anos do século XX traduzem-se num novo ciclo para a indústria portuguesa, com alguns sectores modernos da indústria transformadora a recuperarem a liderança. No entanto, já era percetível uma clara tendência de desindustrialização, com a indústria a perder relevância em favor dos serviços na atividade económica e na ocupação da população ativa.

Década de 2000: Crise financeira e Reindustrialização

A viragem do milénio foi marcada pelo constante crescimento das Indústrias Transformadoras, refletido num valor total de vendas de produtos e serviços que atingiu os 63.739 milhões de euros. Destacaram-se, sobretudo, as Indústrias Alimentares, a Fabricação de Produtos Petrolíferos Refinados, a Produção de Veículos Automóveis e Componentes, a Fabricação de Produtos Metálicos, excluindo Máquinas e Equipamentos, e a produção de Energia. Paralelamente, observou-se um crescimento significativo no setor dos serviços, especialmente na construção civil, têxtil e na reparação e manutenção de máquinas.

Desde a adesão à União Europeia, a economia portuguesa tendeu a concentrar os investimentos no setor terciário em detrimento dos setores produtivos de bens transacionáveis.

Após a crise financeira de 2008, assistiu-se a uma mudança estratégica tanto a nível nacional quanto internacional. A Comissão Europeia adotou a revitalização do setor industrial como uma prioridade fundamental.

Seguindo a corrente europeia, o Estado definiu como estratégia e objetivo a reindustrialização do país, através de incentivos e políticas de simplificação ou desburocratização no processo de revitalização industrial. Estado e setor privado, em particular os empresários e as associações setoriais, mobilizaram-se.

Década de 2010: Indústria 4.0 e Sustentabilidade

Destaca-se em 2013 a aprovação da “Estratégia de Fomento Industrial para o Crescimento e o Emprego 2014-2020”, publicada no Diário da República. Um dos seus principais objetivos era a reindustrialização, visando a modernização, dinamização e diferenciação da indústria nacional. Este plano tinha pretendia reforçar a competitividade e capacidade de diferenciação no mercado global, além de revitalizar o tecido produtivo para impulsionar o crescimento económico e aumentar as exportações, almejando que estas passassem de 34% do PIB para 50% em 2020.

Esta estratégia baseava-se na visão de que a subsistência da indústria europeia deveria assentar na mão-de-obra qualificada, no investimento em Investigação e Desenvolvimento (I&D) e inovação, e na criação de redes colaborativas entre universidades, empresas e infraestruturas tecnológicas. O objetivo era promover a aplicabilidade prática de novos produtos e processos, a eco-eficiência, o eco-design e, consequentemente, alcançar um crescimento sustentável.

Enfrentar o défice de mão-de-obra qualificada tornou-se crucial, exigindo medidas para atrair os jovens para a indústria e melhorar as condições de trabalho, incluindo a remuneração.

Em Portugal assiste-se uma revolução na forma como as empresas operam e produzem, com a adoção de tecnologias como a digitalização, inteligência artificial, Internet das Coisas e automação. A era da Indústria 4.0 vem impulsionar a transformação dos processos industriais, aumentando a eficiência e a competitividade das empresas.

A sustentabilidade ambiental também ganhou destaque, com um número crescente de empresas a adotar práticas de produção sustentáveis e a investir em energias renováveis.

Década de 2020: Desafios e Oportunidades Pós-Pandemia

A indústria portuguesa enfrentou desafios sem precedentes em 2020, com a pandemia COVID-19 a ter um impacto negativo muito significativo na economia nacional. A paralisação quase total em alguns setores resultou numa contração económica que deixou marcas profundas. No entanto, à medida que nos aproximamos do futuro, emerge uma oportunidade única de reconstrução e reinvenção.

A pandemia destacou a importância da resiliência e da adaptação a crises, impulsionando a transição para uma economia mais digital e sustentável. 2021 testemunhou um recorde de investimento na economia portuguesa, com 2,7 mil milhões de euros contratualizados. No rescaldo da crise pandémica COVID-19, com uma guerra na europa e forte instabilidade no médio oriente, o país encontra-se num momento decisivo. Sem prejuízo desta realidade, o momento atual representa, também, uma oportunidade.

Portugal terá acesso a fundos europeus sem precedentes, nomeadamente através do Programa de Recuperação e Resiliência e o novo programa PT2030. Esta é possivelmente a última grande chance de recorrer a fundos comunitários para impulsionar um crescimento sustentável e reduzir a dependência de fontes externas de financiamento.

As últimas décadas foram marcadas por uma rápida evolução tecnológica, com a revolução industrial 4.0 a transformar os processos de produção e a organização da sociedade. Digitalização, “big data”, inteligência artificial e outras tecnologias emergentes estão a redefinir as fronteiras da competitividade e a criar oportunidades de inovação. A robótica e a automação, em paralelo com a requalificação dos recursos humanos e a atração de imigrantes qualificados, têm o potencial de compensar os efeitos negativos da redução da população ativa nas próximas décadas.

No entanto, o sucesso futuro da indústria portuguesa dependerá da sua capacidade de adaptação a estas mudanças e de se posicionar competitivamente numa economia global em constante evolução. A transição climática, o envelhecimento da população e a melhoria dos níveis de bem-estar exigirão uma resposta estratégica e inovadora.

Apesar da dinâmica demográfica negativa, o novo paradigma das energias renováveis pode proporcionar a Portugal, pela primeira vez desde a revolução industrial, uma vantagem competitiva.

Portugal enfrenta o desafio de atrair e reter talento qualificado, garantindo que as empresas tenham acesso às competências necessárias para prosperar num ambiente tecnológico e globalizado. A colaboração entre empresas, instituições de ensino e entidades de investigação será crucial para impulsionar a inovação e promover o crescimento económico.

À medida que nos aproximamos do futuro, a indústria portuguesa continua sua jornada de transformação e crescimento. Com uma visão estratégica e investimentos contínuos em inovação e sustentabilidade, irá Portugal superar os desafios do século XXI?

 

Fonte